A modulação ou limitação temporal dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade

1 Controle de constitucionalidade
O controle de constitucionalidade é uma grande ferramenta criada
pelo legislador constituinte originário para controlar os atos normativos.2
A análise desenvolvida pelo controle de constitucionalidade tem
por escopo assegurar que as normas constitucionais sejam respeitadas, a
fim de que não haja o desrespeito à norma máxima, àquela disposta no
ápice da pirâmide idealizada por Hans Kelsen.3
Quando se fala em pirâmide kelseniana, impende alvitrar do
escalonamento normativo no qual a Constituição está na hierarquia
máxima frente às demais normas, bem como o fato de a Constituição
1 luciano@rcl.adv.br. 2 “Controle de constitucionalidade é, pois, a verificação da adequação de um ato jurídico (particularmente da
lei) à Constituição. Envolve a verificação tanto dos requisitos formais — subjetivos, como a competência do
órgão que o editou — quanto dos requisitos substanciais — respeito aos direitos e às garantias consagradas
na Constituição — de constitucionalidade do ato jurídico” (FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de
direito constitucional. 35. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 34). 3 KELSEN, Hans. Teoria pura del derecho. Montevideo: Fundación de Cultura Universitário, 2001. p. 201 et
seq.
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se enquadrar como norma de validade para todos os atos normativos
do sistema.
Sobre a relevância da Constituição na pirâmide normativa, José
Afonso da Silva destaca o princípio da supremacia da Constituição que
consubstancia a relevância da Constituição a partir do momento em
que esta “se coloca no vértice do sistema jurídico do país, a que confere
validade, e que todos os poderes estatais são legítimos na medida em
que ela os reconheça e na proporção por ela distribuídos. É, enfim, a lei
suprema do Estado, pois é nela que se encontram a própria estruturação
deste e a organização de seus órgãos; é nela que se acham as normas
fundamentais de Estado, e só nisso se notará sua superioridade em relação às demais normas jurídicas.”4
No mesmo sentido, Inocêncio Mártires Coelho destaca que a
Constituição é “a instância de transformação da normatividade, puramente hipotética, da norma fundamental, em normatividade concreta, dos
preceitos de direito positivo — comando posto em vigor — cuja forma e
conteúdo, por isso mesmo, subordinam-se aos ditames constitucionais.”5
Paulo Bonavides enaltece que a “conseqüência dessa hierarquia é
o reconhecimento da ‘superlegalidade constitucional’, que faz da Constituição a lei das leis, a lex legam, ou seja, a mais alta expressão jurídica
da soberania.” 6
Além disso, salienta-se que o controle de constitucionalidade demanda
a presença de dois requisitos, quais sejam, constituição rígida7
e competência de um órgão para dirimir os problemas de constitucionalidade.
2 Teorias de sistemas de controle de constitucionalidade
Duas teorias de sistemas de controle de constitucionalidade preponderam nos ordenamentos jurídicos, a austríaca e a norte-americana.8
4 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 31. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 45. 5 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires Coelho; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito
constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 14. 6 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 296. 7 Sobre a interferência da rigidez da Constituição e o controle de constitucionalidade dos atos normativos, Luiz
Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior enfatizam que “a existência de uma Constituição rígida cria
uma relação piramidal entre esta e as demais normas do mesmo ordenamento jurídico, que com ela devem
guardar relação de necessária lealdade” (ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso
de direito constitucional. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 25). 8 O modelo francês de controle de constitucionalidade também é considerado clássico por alguns juristas, porém
para o presente artigo nem será trabalhado.
Sobre o controle de constitucionalidade francês, Alexandre de Moraes aduz:
“O modelo francês prevê um controle de constitucionalidade preventivo a ser realizado pelo Conselho
Constitucional, que, no transcurso do processo legislativo, poderá, desde que provocado pelo Governo, ou
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A teoria ou sistema norte-americano é conhecido como teoria da
nulidade, já o austríaco como teoria da anulabilidade.
O sistema norte-americano, teoria da nulidade, tem as seguintes
características: a decisão possui eficácia declaratória de uma situação
preexistente; o vício de inconstitucionalidade desenvolve-se no plano de
validade; a rigor, a decisão que declara a inconstitucionalidade produz
efeitos ex tunc;
9
o ato normativo inconstitucional é nulo, ineficaz, írrito
e desguarnecido de qualquer valor normativo ou vinculante; a invalidação ocorre desde o início do ato viciado, ou seja, atinge-o desde a sua
criação; o ato normativo viciado não produz qualquer efeito jurídico.
O surgimento da teoria da nulidade advém do caso Marbury vs
Madison, no qual o Juiz Marshall desenvolveu um raciocínio jurídico
sobre a supremacia da lei constitucional sobre a lei ordinária em que se
infere a conclusão de que todo ato normativo do Congresso contrário
à Constituição deve ser reputado nulo, inválido, írrito e ineficaz.
O sistema americano consagra a via de exceção, de modo a atribuir
que todo tribunal federal ou estadual, não importa a sua natureza ou
grau hierárquico, possa exercitar esse controle, sentenciando numa
demanda a inconstitucionalidade da lei.10 Cabe à Suprema Corte unificar o entendimento sobre decisões possivelmente conflitantes em
tribunais diversos.
Por sua vez, o sistema austríaco, inspirado pelo escólio de Hans
Kelsen, tem as seguintes características: a decisão tem eficácia constitutiva; o vício de inconstitucionalidade afeta o plano da existência; a
rigor a decisão que reconhece a inconstitucionalidade produz efeitos ex
nunc;
11 o ato normativo inconstitucional é ato anulável; o ato normativo
viciado irradia efeitos e consequências jurídicas válidas até que seja
pelo presidente de qualquer das Casas Legislativas, analisar a constitucionalidade de uma proposição ou de
uma emenda, antes de sua promulgação, devendo pronunciar-se no prazo de oito dias.
Ressalta-se, porém, a excepcionalidade prevista no art. 3.7.2 da Constituição francesa, que previu uma
forma de controle repressivo de constitucionalidade. Trata-se da possibilidade de o Conselho Constitucional
francês analisar abstratamente a repartição constitucional de competências entre o Governo e o Parlamento.
Como salienta Favoreu ‘o sistema de repartição de competências entre a lei e o regulamento provocou, por
fim, o surgimento na França de um controle de constitucionalidade das leis’” (MORAES, Alexandre. Direito
constitucional. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 584).
Acerca dos controles de constitucionalidade adotados em outros países, vide Márcio Augusto de Vasconcelos
Diniz (DINIZ, Márcio Augusto de Vasconcelos. Controle de constitucionalidade e teoria da recepção. São Paulo:
Malheiros, 1995. p. 35 et seq.). 9 Os efeitos ex tunc significam a retroatividade dos efeitos, ou seja, retroagem os efeitos da decisão sobre as
situações pretéritas inclusive. 10 BONAVIDES, op. cit., p. 311. 11 Os efeitos ex nunc significam a não retroatividade dos efeitos, ou seja, o não retrocesso dos efeitos da decisão
sobre as situações pretéritas.
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anulado; o reconhecimento da ineficácia do ato normativo viciado se
dá a partir da decisão ou para o futuro, podendo de acordo com o caso
concreto produzir ou não efeitos retroativos.
O sistema austríaco pauta-se pelo controle de constitucionalidade
imbuído a um órgão tão somente, não cabendo a qualquer órgão do
Poder Judiciário realizar o controle de constitucionalidade. Ou seja, a via
eleita para a realização do controle é a via principal.
Paulo Bonavides exalta a diferença entre o sistema americano
com o sistema austríaco ao abordar que “o chamado sistema austríaco
de controle da constitucionalidade, exercitado por ‘via principal’ e
concentrado numa Corte especial” contrasta, doutro lado, “com o sistema
americano clássico, de controle difuso, por via de exceção, e que só se
faz absoluto ou definitivo quando a decisão judicial se contém num
aresto da Suprema Corte”.12
3 Teoria adotada no sistema constitucional brasileiro
O sistema jurídico brasileiro13 adota a teoria da nulidade no controle jurisdicional de constitucionalidade, conforme entendimento da
doutrina majoritária.14
O Supremo Tribunal Federal coaduna deste pensamento:
Atos inconstitucionais são, por isso mesmo, nulos e destituídos, em conseqüência,
de qualquer carga de eficácia jurídica. A declaração de inconstitucionalidade de
uma lei alcança, inclusive, os atos pretéritos com base nela praticados, eis que
o reconhecimento desse supremo vício jurídico, que inquina de total nulidade
os atos emanados do poder público, desampara as situações constituídas sob
sua égide e inibe — ante a sua inaptidão para produzir efeitos jurídicos válidos
— a possibilidade de invocação de qualquer direito. (ADI nº 652/QO, Rel. Min.
Celso de Mello, julgamento em 2.04.92, DJ, 2 abr. 1993)15
Desse modo, o ato jurisdicional ao declarar um ato normativo
inconstitucional afeta o plano de validade deste. Isto representa que o ato
12 Ibidem, p. 309. 13 Acerca do sistema de controle de constitucionalidade brasileiro, vide Manoel Gonçalves Ferreira Filho (FERREIRA
FILHO, Manoel Gonçalves. Princípios fundamentais do direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 133-
148), Gilmar Ferreira Mendes (MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires Coelho; BRANCO, Paulo
Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 1049 et seq.) e Kildare
Gonçalves Carvalho (CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito constitucional. 14. ed. Belo Horizonte: Del Rey,

  1. p. 394 et seq.). 14 Sobre o assunto, vide José Afonso da Silva (SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 31.
    ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 50 et seq.). 15 No mesmo sentido: ADI nº 1.434/MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 29.08.96, DJ, 22 nov. 1996.
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    judicial ao declarar um ato viciado, em razão de vício formal ou material,
    considera-o natimorto, ou seja, desde o seu nascimento já fora concebido
    em desacordo com o parâmetro de validade e logo não poderá irradiar
    qualquer efeito, visto que é desguarnecido de força vinculante.
    No entanto, ressalta-se que não há uma unanimidade da doutrina
    pátria no sentido de que o sistema brasileiro adota a teoria da nulidade,
    e não a teoria da anulabilidade.
    Alguns juristas que discordam da teoria da nulidade como apta
    ao Direito Constitucional Brasileiro. por exemplo, são liderados por
    Pontes de Miranda16 e Regina Nery Ferrari.17
    4 Mitigação da teoria da nulidade no sistema brasileiro
    No Brasil, a teoria da nulidade sempre estampou o caminho hábil
    para o controle jurisdicional de constitucionalidade no sentido de que
    a decisão tornava o ato viciado desamparado de qualquer eficácia desde
    a sua edição, via de consequência caracterizando a decisão com efeitos
    ex tunc.
    Os efeitos ex tunc culminam no retroagir da condição de validade
    do ato viciado desde do momento da sua geração, e não somente a partir
    da decisão que declara a sua inconstitucionalidade.
    Tal situação gera efeitos práticos, por vezes, perniciosos e gravosos
    à segurança e boa-fé de pessoas afetas direta ou indiretamente com o
    ato viciado declarado inconstitucional.
    Diante deste panorama, o legislador infraconstitucional prescreveu
    o artigo 27 da Lei nº 9.868/99, o qual estipula que:
    Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em
    vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o
    Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir
    de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.
    Da intelecção do artigo supra transcrito, verifica-se que em determinados casos poderá o Supremo Tribunal Federal restringir os efeitos
    da decisão judicial ou determinar que os seus efeitos prospectem sobre
    um termo futuro ou a partir do seu trânsito em julgado. Tal circunstância
    16 MIRANDA, F. C. Pontes de. Comentários à Constituição de 1946. t. VI, p. 413 et seq. 17 FERRARI, Regina Maria Macedo Nery. Efeitos da declaração de inconstitucionalidade. 4. ed. São Paulo: Revista
    dos Tribunais, 1999.
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    é chamada de modulação ou limitação temporal dos efeitos da declaração
    de inconstitucionalidade.
    Ressalta-se que tal raciocínio se dá com base na Lei nº 9.868, de 10
    de novembro de 1999, a qual dispõe sobre o julgamento da ação direta
    de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade.
    Ou seja, o raciocínio ora esposado aplica-se tão somente às ações declaratórias de constitucionalidade.
    Com isso, verifica-se que o controle de constitucionalidade pela via
    de exceção a priori estaria afastado da restrição dos seus efeitos ou da
    estipulação de efeitos prospectivos.
    Entretanto, numa interpretação sistemática, o Supremo Tribunal
    Federal estendeu a possibilidade de conceder efeitos diversos da teoria
    da nulidade para o controle de constitucionalidade pela via de exceção
    também.
    O lead case por parte do Supremo Tribunal Federal foi o Recurso
    Extraordinário nº 197.917, julgado em 07 de maio de 2004, no qual se
    confrontava a autonomia municipal para legislar sobre quantidade de
    vereadores nos municípios.
    No referido caso concreto, o Supremo Tribunal Federal compreendeu que a declaração de nulidade de legislações por desrespeito ao
    texto constitucional afrontaria ao interesse público, bem como geraria
    insegurança jurídica.
    Tal caso pode ser visualizado pela ementa transcrita a seguir:
    Municípios. Câmara de vereadores. Composição. Autonomia municipal. Limites
    constitucionais. Número de vereadores proporcional à população. CF, artigo
    29, lV. aplicação de critério aritmético rígido. Invocação dos princípios da
    isonomia e da razoabilidade. Incompatibilidade entre a população e o número
    de vereadores. Inconstitucionalidade, incidenter tantum, da norma municipal.
    Efeitos para o futuro. Situação excepcional. (…) Efeitos. Princípio da segurança
    jurídica. Situação excepcional em que a declaração de nulidade, com seus normais
    efeitos ex tunc, resultaria grave ameaça a todo o sistema legislativo vigente.
    Prevalência do interesse público para assegurar, em caráter de exceção, efeitos
    pro futuro à declaração incidental de inconstitucionalidade. (RE nº 197.917,
    Rel. Min. Maurício Corrêa, julgamento em 06.06.02, DJ, 7 maio 2004)
    A sistemática adotada pelo Supremo Tribunal Federal permanece
    na mesma diretriz, consoante se infere de decisão mais recente a qual
    reflete a linha da referida Corte:
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    (…) A declaração de inconstitucionalidade reveste-se, ordinariamente, de eficácia
    ex tunc (RTJ nº 146/461-462 – RTJ nº 164/506-509), retroagindo ao momento
    em que editado o ato estatal reconhecido inconstitucional pelo Supremo Tribunal
    Federal. O Supremo Tribunal Federal tem reconhecido, excepcionalmente,
    a possibilidade de proceder à modulação ou limitação temporal dos efeitos da
    declaração de inconstitucionalidade, mesmo quando proferida, por esta Corte,
    em sede de controle difuso. (Precedente: RE nº 197.917/SP, Rel. Min. Maurício
    Corrêa (Pleno). RE nº 395.902-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento
    em 07.03.06, DJ, 25 ago. 2006).18
    4.1 Requisitos para a modulação ou limitação temporal dos efeitos da
    declaração de inconstitucionalidade
    A declaração da prospecção dos efeitos da decisão ou ainda que os
    seus efeitos sejam ex nunc depende de dois requisitos.
    O primeiro é formal e procedimental, qual seja, a modulação
    dos efeitos da decisão sejam julgados por dois terços dos ministros que
    compõem o Supremo Tribunal Federal.
    Como o Supremo Tribunal Federal é composto por onze ministros,
    conforme reza o artigo 101 da Constituição da República,19 logo a conta
    aritmética pura e simples resultaria na quantidade de 7,3, ou seja, daria
    uma dízima periódica sobre parcela de um ser humano.
    Ante a impossibilidade de segmentação de um ministro, o requisito formal arredonda-se para mais, o que per si determina a necessidade
    de oito ministros20 manifestarem-se a favor da prospecção dos efeitos
    da decisão de controle de constitucionalidade.21
    Quanto ao requisito material, qual seja, existência de excepcional
    interesse público ou necessidade de segurança pública, este é mais
    complicado.
    A sua dificuldade decorre da inexorabilidade de um juízo de valores sobre o caso concreto por parte do Supremo Tribunal Federal para
    examinar se o caso comporta ou não a quebra da regra da teoria da
    nulidade.
    18 No mesmo sentido: AI nº 720.991, Rel. Min. Cármen Lúcia, decisão monocrática, julgamento em 19.05.09,
    DJe, 27 maio 09. 19 “Art. 101. O Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de
    trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada.” 20 PIMENTA, Marcelo Vicente de Alkmim. Teoria da Constituição. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 226. 21 Demonstrando o requisito formal, vide a decisão do Supremo Tribunal Federal: “A atribuição de efeitos
    prospectivos à declaração de inconstitucionalidade, dado o seu caráter excepcional, somente tem cabimento
    quando o tribunal manifesta-se expressamente sobre o tema, observando-se a exigência de quorum qualificado
    previsto em lei” (AI nº 457.766-AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 3.04.07, DJ, 11
    maio 07).
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    O aludido juízo de valores deve pautar-se com esteio no princípio
    da segurança jurídica ou excepcional interesse social.
    Tanto o princípio da segurança jurídica quanto o excepcional
    interesse social são considerados conceitos jurídicos indeterminados,
    também denominado de conceitos vagos, imprecisos, elásticos, fluidos
    e práticos.22
    Conceito jurídico indeterminado23 figura-se presente quando a lei
    deixa à “Administração a possibilidade de apreciação segundo critérios de
    oportunidade e conveniência”, segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro.24
    Por sua vez, os conceitos jurídicos indeterminados vão depender
    da interpretação do exegeta. Dependência do intérprete não significa
    discricionariedade absoluta sem qualquer norte.
    A discricionariedade, nos dizeres de Celso Antônio Bandeira de
    Mello, representa:
    (….) a margem de ‘liberdade’ que remanesça ao administrador para eleger,
    segundo critérios consistentes de razoabilidade, um, dentre pelo menos dois
    comportamentos, cabíveis perante cada caso concreto, a fim de cumprir o dever
    de adotar a solução mais adequada à satisfação da finalidade legal, quando,
    por força da fluidez das expressões da lei ou da liberdade conferida no mandamento, dela não se possa extrair objetivamente uma solução unívoca para
    a situação vertente.25
    Ou seja, a partir do conceito acima explicitado, dessume-se que
    discricionariedade é dissociada de arbitrariedade ou do bel-alvitre do
    intérprete.
    Sempre o intérprete deve buscar a realidade social na aplicação
    do direito. Não se admite mais hodiernamente que o intérprete aplique
    o direito fugindo dos seus anseios. O direito passa a ser concebido no
    atual momento como uma necessidade da sociedade atual para a concatenação dos problemas que afloram no ambiente social. Interpretar
    22 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 25. ed. Malheiros: São Paulo, 2008.
    p. 951. 23 Eros Roberto Grau apresenta em sua obra “Ensaio e discurso sobre a interpretação/aplicação do direito” a
    seguinte crítica sobre conceito jurídico indeterminado:
    “(….) não existem conceitos indeterminados. Se é indeterminado o conceito, não é conceito. O mínimo que
    se exige de uma suma de idéias, abstrata, para que seja um conceito é que seja determinada. Insisto: todo
    conceito é um suma de idéias que, para ser conceito, tem de ser, no mínimo, determinada; o mínimo que se
    exige de um conceito é que seja determinado. Se o conceito não for, em sim uma suma determinada de idéias,
    não chega a ser conceito” (GRAU, Eros Roberto. Ensaio e discurso sobre a interpretação/aplicação do direito.
  2. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 238-239). 24 DI PIETRO, Maria Sylvia. Direito administrativo. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 225. 25 BANDEIRA DE MELLO, op. cit., p. 957.
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    o direito junto com o contexto não significa nem de quilômetros de
    distância refutar o positivismo ou quebrar a segurança jurídica do sistema
    para dar azo à interpretação desarrazoada ou desapegada a qualquer
    norma jurídica.
    Interpretar o direito de acordo com o contexto e a sua melhor
    efetividade no seio social representa a responsabilidade jurídica e personalíssima do intérprete. Até porque o intérprete não realiza qualquer
    trabalho mecânico, se não haveria uma máquina para apreciar o caso
    concreto e aplicar o direito. Os robôs já teriam substituídos os seres
    humanos na aplicação direito. Tal raciocínio aplica-se conquanto haja
    seres aplicadores do direito “apensantes”.
    Sobre a indispensabilidade de correlação perene entre a interpretação jurídica e a relação social, Pablo Jiménez Serrano esclarece que “(…)
    a interpretação jurídica está condicionada à norma, que, por sua vez,
    é o resultado da realidade social. Por isso mesmo, e de forma indireta,
    ao pesquisar o direito, e ao interpretar as normas jurídicas, estaremos
    conhecendo e avaliando o nível de desenvolvimento da realidade social.
    Verifica-se, portanto, que o direito como fenômeno social é o objeto
    mediato da interpretação jurídica.”26
    Para coligir a necessidade de segurança jurídica ou o excepcional
    interesse social é irremediável que exista a motivação por parte dos
    julgadores. Ou seja, consoante se verifica, o Supremo Tribunal Federal ao
    apreciar as demandas concretas deverá avaliar e motivar explicitamente
    quais as razões que o levam a rechaçar o efeito ex tunc.
    A motivação da decisão judicial é imperiosa, segundo se desprende
    do inciso IX do art. 93 da Constituição Federal:
    Art. 93 ….
    IX todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e
    fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar
    a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou
    somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade
    do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;
    Por intermédio da motivação é que haverá o controle sobre a mitigação dos efeitos da decisão de controle de constitucionalidade, para
    então saber se o princípio da segurança jurídica deveria preponderar
    26 SERRANO, Pablo Jiménez. Interpretação jurídica. São Paulo: Desafio Cultural, 2002. p. 84.
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    sobre o princípio da supremacia da Constituição. Isto é, a motivação
    torna-se elemento essencial para o controle da modulação dos efeitos
    da decisão.27
    Segundo a jurista Gisela Maria Bester, a ponderação do princípio
    da supremacia da Constituição versus o princípio da segurança jurídica
    é um embate abstruso:
    Pensamos que a reflexão a ser feita, porque está por trás de toda esta novidade
    de flexibilização da nulidade, é a seguinte: no conflito entre o princípio da segurança jurídica e da supremacia da Constituição, deve prevalecer o primeiro?
    Logo, uma das novidades mais negativas nos parece ser sem dúvida o fato de
    não se fixar nenhum prazo limite para que o STF manobre a fixação do início
    dos efeitos diferidos de que trata o art. 27.
    (…) postergar o início dos efeitos não é uma novidade no Direito comparado,
    mas desde que seja feito como limite de tempo (…) diferentemente do STF,
    que recebeu do legislador a autorização para modular os efeitos de uma decisão
    que efetivamente declara uma norma inconstitucional.28
    Como uma tarefa de relevância e imperiosa ao intérprete, ora
    julgador, resta impreterível que a ponderação29 entre os princípios da
    segurança jurídica e o da supremacia da Constituição seja claramente
    explicitada no acórdão, até para que posteriormente ocorra o possível
    controle sobre os referidos atos jurisdicionais.30
    A preponderância de um princípio sobre o outro no caso concreto
    não gera a não incidência do outro princípio ou a sua expurgação do
    ordenamento na situação analisada, mas tão somente o seu menor peso
    numa determinada relação fática.
    Apesar de colocar aqui o princípio da segurança jurídica versus
    o princípio da supremacia da Constituição, insta destacar que outros
    princípios acompanham o princípio da segurança nesta contenda, como,
    por exemplo, o princípio da boa-fé, da confiança legítima e da lealdade.
    27 Sempre válido lembrar das diferenças entre motivo e motivação, recorrendo ao auxílio do jurista Marçal Justen
    Filho.
    “A motivação se relaciona à forma do ato administrativo e consiste na exposição formal do motivo. O motivo
    é esse processo mental interno ao agente que pratica o ato. A motivação consiste na exteriorização formal do
    motivo, visando a propiciar o controle quanto à regularidade do ato.
    Para ser mais preciso, a motivação consiste na exposição por escrito da representação mental do agente
    relativamente aos fatos e ao direito, indicando os fundamentos que o conduziram a agir em determinado
    sentido.” (JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 199). 28 BESTER, Gisele Maria. Direito constitucional. São Paulo: Manole, 2005. v. 1, p. 534. 29 Sobre a técnica da ponderação, vide os comentários de Luis Roberto Barroso (BARROSO, Luis Roberto. Curso
    de direito constitucional contemporâneo. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 333 et seq.). 30 Sobre colisão de princípios, é indispensável remeter à clássica obra moderna de Robert Alexy (ALEXY, Robert.
    Teoria dos direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2008).
    A modulação ou limitação temporal dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade 187
    A&C R. de Dir. Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte, ano 10, n. 42, p. 177-190, out./dez. 2010
    Para finalizar este tópico, convém enaltecer o zelo que o Supremo
    Tribunal Federal deverá prezar para evitar que decisões sejam proferidas
    no controle abstrato com efeitos ex nunc e os casos concretos em julgamento.
    Para tanto, vide o alerta de Gilmar Ferreira Mendes:
    Daí parecer razoável que o próprio STF declare, nesses casos, a inconstitucionalidade com eficácia ex nunc na ação direta, ressalvando, porém, os casos
    concretos já julgados ou, em determinadas situações, até mesmo os casos
    sub judice, até a data de ajuizamento da ação direta de inconstitucionalidade.
    Essa ressalta assenta-se em razões de índole constitucional, especialmente no
    princípio da segurança jurídica. Ressalta-se aqui que, além da ponderação
    central entre o princípio da nulidade e outro princípio constitucional, com a
    finalidade de definir dimensão básica da limitação, deverá a Corte fazer outras
    ponderações, tendo em vista a repercussão da decisão tomada no processo de
    controle in abstracto nos diversos processos de controle concreto.31
    4.2 Posições do Supremo Tribunal Federal sobre a modulação dos
    efeitos
    Apesar de ilustrar os tópicos anteriores, sempre forçoso colacionar
    alguns recentes julgados e posições do Supremo Tribunal Federal no julgamento dos efeitos das ações de controle de constitucionalidade.
    Um clássico exemplo de modulação dos efeitos ocorreu no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade no qual se debatia a
    constitucionalidade da legislação mineira sobre educação.
    Em tal oportunidade o Supremo Tribunal Federal entendeu que
    não poderiam todas as pessoas que obtiveram certificados e diplomas
    em cursos reconhecidos com base numa lei declarada posteriormente
    inconstitucional serem prejudicadas.
    Vide trecho desta decisão:
    Invade a competência da União para legislar sobre diretrizes e bases da educação
    a norma estadual que, ainda que de forma indireta, subtrai do Ministério da
    Educação a competência para autorizar, reconhecer e credenciar cursos em
    instituições superiores privadas. (…) Tendo em vista o excepcional interesse
    social, consistente no fato de que milhares de estudantes freqüentaram e
    freqüentam cursos oferecidos pelas instituições superiores mantidas pela
    iniciativa privada no Estado de Minas Gerais, é deferida a modulação dos efeitos
    da decisão (art. 27 da lei 9.868/1999), a fim de que sejam considerados válidos
    os atos (diplomas, certificados, certidões etc.) praticados pelas instituições
    superiores de ensino atingidas por essa decisão, até a presente data, sem prejuízo
    31 MENDES; COELHO; BRANCO, op. cit., p. 1324.
    188 Luciano Elias Reis
    A&C R. de Dir. Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte, ano 10, n. 42, p. 177-190, out./dez. 2010
    do ulterior exercício, pelo Ministério da Educação, de suas atribuições legais
    em relação a essas instituições superiores. (ADI nº 2.501, Rel. Min. Joaquim
    Barbosa, julgamento em 04.09.08, DJe, 19 dez. 2008)
    Um caso bastante emblemático no que se refere à modulação dos
    efeitos da decisão de controle de constitucionalidade versa sobre a possibilidade de requerer tal limitação temporal em sede de embargos declaratórios e não no pedido recursal.
    Acerca do assunto, a Corte tem prolatado o seguinte entendimento:
    É cabível a oposição de embargos de declaração para fins de modulação dos
    efeitos de decisão proferida em ação direta de inconstitucionalidade, ficando
    seu acolhimento condicionado, entretanto, à existência de pedido formulado
    nesse sentido na petição inicial. Com base nesse entendimento, o Tribunal
    conheceu de embargos de declaração opostos de decisão proferida em ação
    direta em que se discutia o cabimento desse recurso para a modulação dos efeitos
    da declaração de inconstitucionalidade e, por maioria, os rejeitou. (…). Não se
    vislumbrou omissão a ser sanada na decisão embargada, visto que não se indicara, de forma expressa, na inicial da ação, a existência de pedido para a
    modulação de efeitos. Ressaltou-se, ademais, a jurisprudência do Tribunal,
    no sentido de que, se ele não modula os efeitos, isso significa que prevalece a
    conseqüência que resulta da declaração de inconstitucionalidade, qual seja, a
    de aplicação retroativa da decisão com eficácia ex tunc. (ADI nº 2.791-ED, Rel.
    p/ o ac. Min. Menezes Direito, julgamento em 22 abr. 2009, Plenário, Informativo 543)
    Outra peculiaridade atina-se à necessidade ou não de o Supremo
    Tribunal Federal manifestar-se em todas as ações de controle de constitucionalidade sobre a concessão ou não dos efeitos prospectivos.
    Sobre a situação, o Supremo Tribunal Federal já exarou posição
    no seguinte sentido:
    Embargos de declaração: pretensão incabível de incidência, no caso, do art.
    27 da LADIn. Sobre a aplicação do art. 27 da LADIn — admitida por ora
    a sua constitucionalidade — não está o Tribunal compelido a manifestarse em cada caso: se silenciou a respeito, entende-se que a declaração de
    inconstitucionalidade, como é regra geral, gera efeitos ex tunc, desde a vigência
    da lei inválida. (ADI nº 2.996-ED, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento
    em 14.12.06, DJ, de 16 mar. 2007)
    Desse modo, se não houve a manifestação por parte do Tribunal,
    então se compreende pela negativa de efeitos prospectivos.
    A modulação ou limitação temporal dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade 189
    A&C R. de Dir. Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte, ano 10, n. 42, p. 177-190, out./dez. 2010
    5 Conclusão
    Ante as breves considerações, conclui-se que a mitigação da teoria
    da nulidade dos efeitos do ato jurisdicional que declara a inconstitucionalidade de um ato normativo representa um avanço à segurança jurídica
    da sociedade brasileira, porque a simples invalidação desde o nascimento
    do ato normativo deixava uma grande margem de obscuridade e prejuízos à estabilidade das relações jurídicas que outrora haviam sido travadas
    com espeque na legalidade e que, posteriormente à declaração, ficavam
    desprovidas de efeito vinculante normativo.
    Todavia, a modulação ou limitação temporal dos efeitos deve ser
    concedida de forma criteriosa de acordo com o caso concreto, a fim de
    evitar uma possível banalização.
    Além disso, por derradeiro, compete apontar que a motivação deve
    ser explícita e bem justificada no acórdão, a fim de que reste preenchido
    o requisito material para a negativa da concessão de efeitos ex tunc, qual
    seja, a necessidade de guarida de segurança jurídica ou excepcional
    interesse social.
    Brazilian Constitucionality Control, Focusing the Inconstitucionality
    Declaration Effects
    Abstract: The present article is about brazilian constitucionality control,
    focusing the inconstitucionality declaration effects, specially it’s modulation
    and limitation in time. Initially, describes the constitucionality control
    historcial evolution, reaching the actual brazilian control method, under
    Federal Law n. 9.868/1998, and it’s interpretation given by Brazil’s Supreme
    Court trials.
    Key words: Inconstitucionality declaration effects. In time modulation.
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    Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira
    de Normas Técnicas (ABNT):
    REIS, Luciano Elias. A modulação ou limitação temporal dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade. A&C – Revista de Direito Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte,
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